quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Pan - O Deus dos bosques

Pan - O Deus dos bosques






Nascimento de Pã




Pã, antiquíssima divindade pelágica especial à Arcádia, é o guarda dos rebanhos que ele tem por missão fazer multiplicar. Deus dos bosques e dos pastos, protetor dos pastores, veio ao mundo com chifres e pernas de bode. Pã é filho de Mercúrio. Era assaz natural que o mensageiro dos deuses, sempre considerado intermediário, estabelecesse a transição entre os deuses de forma humana e os de forma animal. Parece, contudo, que o nascimento de Pã provocou certa emoção em sua mãe, assustadíssima com tão esquisita conformação; e as más línguas pretendem até que, quando Mercúrio apresentou o filho aos demais deuses, todo o Olimpo desatou a rir. Mas como é provável que haja nisso um pouco de exagero, convém restabelecer os fatos na sua verdade, e eis o que diz o hino homérico sobre a estranha aventura. "Mercúrio chegou à Arcádia fecunda em rebanhos; ali se estende o campo sagrado de Cilene; nesses páramos, ele, deus poderoso, guardou as alvas orelhas de um simples mortal, pois concebera o mais vivo desejo de se unir a uma bela ninfa, filha de Dríops. Realizou-se enfim o doce o doce himeneu. A jovem ninfa deu à luz o filho de Mercúrio, menino esquisito, de pés de bode, e testa armada de dois chifres. Ao vê-lo, a nutriz abandona-o e foge. Espantam-na aquele olhar terrível e aquela barba tão espessa. Mas o benévolo Mercúrio, recebendo-o imediatamente, pô-lo ao colo, rejubilante. Chega assim à morada dos imortais ocultando cuidadosamente o filho na pele aveludada de uma lebre. Depois, apresenta-lhes o menino. Todos os imortais se alegram, sobretudo Baco, e dão-lhe o nome de Pã, visto que para todos constituiu objeto de diversão."

As ninfas zombavam incessantemente do pobre Pã em virtude do seu rosto repulsivo, e o infeliz deus, ao que se diz, tomou a resolução de nunca amar. Mas Cupido é cruel e afirma uma tradição que Pã, desejando um dia lutar corpo a corpo com ele, foi vencido e abatido, diante das ninfas que se riam.

Pã e Syrinx






Um dia percorria Pã o monte Liceu, segundo o seu hábito, e encontrou a ninfa Syrinx que jamais quisera receber as homenagens das divindades e que só tinha uma paixão: a caça. Aproximou-se dela, e como nos costumes campestres se vai imediatamente ao objetivo, sem nenhum artifício, sem nenhum desvio, disse-lhe: "Cedei, formosa ninfa, aos desejos de um deus que pretende tornar-se vosso esposo." (Ovídio).

Queria falar mais; mas Syntrix, pouco sensível àquelas palavras, deitou a correr, e já chegara perto do rio Ladon, seu pai, quando, vendo-a detida, rogou às ninfas, suas irmãs, que a acudissem. Pã, que lhe saíra no encalço, quis abraçá-la, mas em vez de uma ninfa, só abraçou caniços. Suspirou e os caniços agitados emitiram um som doce e queixoso. O deus, comovido com o que acabava de ouvir, pegou alguns caniços de tamanho desigual e, unindo-os com cera, formou a espécie de instrumentos que se chama syrinx e que constitui a flauta de sete tubos, transformada em atributo de Pã.

Pítis Metamorfoseada em Pinheiro
Com efeito, em breve, os melodiosos acordes fazem acorrer de toda parte as ninfas que vêm dançar em volta do deus chifrudo. A ninfa Pítis parece tão enternecida que Pã renasce com a esperança e crê que o seu talento faz com que seja esquecido o rosto. Sempre tocando a flauta de sete tubos, começa a procurar lugares solitários e percebe, finalmente, um rochedo escarpado no alto do qual resolve sentar-se. Pítis segue-o. Para melhor ouvi-lo, aproxima-se cada vez mais, tanto que Pã, vendo-a bem perto, julga o momento oportuno para lhe falar. Não sabia o infeliz que Pítis era amada por Bóreas, o terrível vento do norte, que naquele instante soprava com grande violência. Vendo a amante perto de um deus estranho, Bóreas foi acometido de um acesso de ciúme furioso, e, não se contendo, soprou com tal impetuosidade que a ninfa caiu no precipício, e despedaçou contra as pedras o formoso corpo, imediatamente transformado pelos deuses em pinheiro. Foi depois disso que essa árvore, que traz o nome da ninfa (Pítis significa, em grego, pinheiro) foi consagrada a Pã, e é por esse motivo que nas representações figuradas, a cabeça de Pã está muitas vezes coroada de ramos de pinheiro.

Pã e a Ninfa Eco





O destino de Pã era amar sempre sem que nunca lograsse unir-se à criatura amada. Continuando a fazer música na montanha, ouviu, saída do fundo do vale, uma terna voz que parecia repetir-lhe os acordes. Era a voz da ninfa Eco, filha do Ar e da Terra. Desceu, então, para procurar a que lhe havia respondido, sem nunca poder atingi-la, embora ela lhe respondesse constantemente; a cruel ninfa parecia rir-se dele. Mas, francamente, ninguém a pode censurar por isso. Quando se ama o belo Narciso, como é possível encarar o velho Pã? Pã é sempre velho, apesar de ter tido por pai Mercúrio, que é eternamente jovem.

Pã, Filho de Mercúrio

Um dia o pai e o filho encontraram-se:

Pã. - Bom dia, Mercúrio, meu pai!

Mercúrio. - Bom dia. Como dizes que sou teu pai?

Pã. - Não és Mercúrio, o deus de Cilene?

Mercúrio. - Sim. Como és meu filho?... Ah, por Júpiter! Lembro-me agora da aventura! Quer dizer que eu, que tanto me orgulho desta minha beleza, e que não tenho barba, devo ser chamado teu pai! Todos se riram de mim, por ser meu filho um sujeito tão bonito assim!

Pã. - Mas eu não vos desonro, meu pai. Sou músico e toco muito bem flauta. Baco não dá um passo sem mim. Escolheu-me por amigo e companheiro das danças, e sou eu quem lhe conduz os coros.

Mercúrio. - Pois bem, Pã (creio que é esse o teu nome), sabes como podes ser-me agradável? E queres, além disso, conceder-me um favor?

Pã. - Ordenai, meu pai, e nós veremos.

Mercúrio. - Vem cá, dá-me um abraço. Mas cuida de não me chamares de pai na presença de estranhos. (Luciano).

Pã, Divindade Pastoril

Como símbolo da obscuridade, Pã causa nos homens os terrores pânicos, isto é, sem motivo. Na batalha de Maratona, inspirou aos persas um desses terrores súbitos, o que contribuiu bastante para assegurar a vitória aos gregos. Foi por causa desse auxílio que os atenienses lhe consagraram uma gruta na Acrópole.

Todavia, a princípio, Pã nada mais era do que a divindade pastoril dos arcádios que o invocavam para que lhes multiplicasse os rebanhos. "Glauco e Coridon, que conduzem juntos os seus rebanhos de bois pelas montanhas, ambos arcádios, imolaram a Pã, guarda do monte Cilene, a novilha de lindas pontas; e as pontas, de doze palmas, prenderam-nas em sua honra, mediante um longo cravo, ao tronco deste plátano copado, bela oferta ao deus dos pastores." (Antologia).

As imagens primitivas de Pã eram providas de um símbolo cuja crueza significativa nada possuía naquele tempo de licencioso. O seu culto, que posteriormente se sumiu diante do das divindades do Olimpo, é extremamente antigo na Arcádia e muito certamente anterior a qualquer civilização. "Quando a educação do gado não prosperava, diz Creuzer, os pastores arcádios golpeavam os ídolos do deus Pã, costume que prova a sua profunda barbaridade em matéria de religião."

Pã, deus Universal





Sob a influência da poesia órfica, o deus Pã tornou-se o símbolo panteísta fundado na interpretação do seu nome: a flauta de sete tubos representa, então, as sete notas da harmonia universal, e a fusão das formas animais com as formas humanas corresponde ao caráter múltiplo da vida no universo. É sob tal aspecto que Pã nos surge numa linda composição de Gillot. Essa imagem corresponde à idéia que da antigüidade tinha o século dezoito. Toda natureza está em festa diante do deus que simboliza a universalidade dos seres; mas tal festa, tão repleta de vida e de movimento, nos lembra as quermesses flamengas muito mais que os baixos-relevos antigos.

Sob o reinado de Tibério, estando um navio ancorado, ouviu-se uma voz misteriosa que gritava: "O grande deus Pã morreu!" Desde então, nunca mais se ouviu falar dele.

Um Pouco mais de Pã

O deus Pã, assim chamado, diz-se da palavra grega pã, que quer dizer tudo, era filho, segundo uns, de Júpiter e da ninfa Timbris, segundo outros de Mercúrio e da ninfa Penélope. Dizem outras tradições que era filho de Júpiter e da ninfa Calisto, ou talvez do Ar e de uma Nereida, ou finalmente do Céu e da Terra. Todas essas diversas origens têm uma explicação, não só no grande número de deuses com esse nome, mas ainda nas múltiplas atribuições que a crença popular emprestava a essa divindade. O seu nome parecia indicar a extensão do poder, e a seita dos filósofos estóicos identificava Pã com o Universo, ou ao menos com a natureza inteligente, fecunda e criadora.

Mas a opinião comum não se elevava a uma concepção tão geral e filosófica. Para os povos, o deus Pã tinha um caráter e uma missão sobretudo agrestes. Se nos mais remotos tempos ele havia acompanhado os deuses do Egito, na sua expedição das Índias, se tinham inventado a ordem de batalha e a divisão das tropas em ala direita e em ala esquerda, o que os gregos e os latinos chamavam os cornos de um exército, se era mesmo por essa razão que o representavam com chifres, símbolo da sua força e da sua invenção, a imaginação popular, desde logo tendo restringido e limitado as suas funções, havia-o colocado nos campos, entre os pastores e os rebanhos.

Era principalmente venerado na Arcádia, região das montanhas, onde proferia oráculos. Em sacrifício ofereciam-lhe mel e leite de cabra. Celebravam-se em honra sua as Lupercais, festas que depois se espalharam na Itália, onde o árcade Evandro levou o culto de Pã. Representam-no ordinariamente muito feio, com os cabelos e a barba descuidados, com chifres, e corpo de bode da cintura para baixo, enfim, pouco diferente de um fauno ou de um sátiro. Muitas vezes empunha um cajado e uma flauta de sete tubos que se chama a flauta do Pã, porque se diz que foi ele o inventor, graças à metamorfose da ninfa Sirinx em juncos do Ladon.

Viam-no também como o deus dos caçadores; quando ia à caça, mais do que dos animais ferozes era o terror das ninfas, a quem perseguia com os seus ardores amorosos. Está sempre atrás de emboscadas atrás dos rochedos e das moitas; para ele o campo não tem mistérios. Foi por isso que descobriu e revelou, a Júpiter, o esconderijo de Ceres, depois do rapto de Prosérpina.

Pã foi muitas vezes confundido na literatura latina com Fauno e Silvano. Muitos autores os consideravam como um só divindade com diferentes nomes. As Lupercais eram mesmo celebradas em tríplice honra desses gênios. Entretanto Pã é o único de quem se fez alegoria e que foi considerado como um símbolo da Natureza, conforme a significação do seu nome. Dizem os mitólogos que os seus chifres representam os raios do Sol; a vivacidade de sua tez exprime o fulgor do céu; a pele de cabra estrelada que usa sobre o estômago representa as estrelas do firmamento; enfim os seus pés e as suas pernas eriçados de pêlos designam a parte inferior do mundo, - a terra, as árvores e as plantas.

Os seus amores suscitaram-lhe rivais, às vezes perigosos. Um deles, Bóreas, quis arrebatar violentamente a ninfa Pitis, que era a Terra, condoída, metamorfoseou em pinheiro. Eis a razão porque essa árvore, conservando ainda, os sentimentos da ninfa, coroa Pã com a sua folhagem, enquanto o sopro do Bóreas excita os seus gemidos.

Pã também foi amado por Silene, isto é, a Lua ou Diana, que para ir visitá-lo nos vales e nas grutas das montanhas, esquece o belo e terno dormilão Endímion.



Sob o reinado de Tibério a fábula do grande Pã motivou um acontecimento que interessou vivamente a cidade de Roma e que merece ser contado. "No mar Egeu, diz Plutarco, estando uma tarde o navio do piloto Tamo nas imediações de certas ilhas, o vento cessou de repente. Todas as pessoas a bordo estavam bem acordadas, muitas mesmo passavam o tempo bebendo umas com as outras, quando ouviram de súbito uma voz que vinha das ilhas e que chamava Tamo. Tamo deixou que o chamassem duas vezes sem responder, mas à terceira respondeu. A voz então ordenou-lhe que, ao chegar a um certo lugar, gritasse que o grande Pã tinha morrido. Não houve ninguém a bordo que não ficasse tomado de terror e de espanto. Deliberou-se se Tamo devia obedecer à voz e Tamo concluiu que, se quando chegassem à paragem indicada, houvesse bastante vento para passar adiante, não era preciso dizer nada; mas que se aí uma calmaria os detivesse, era necessário desempenhar-se da ordem recebida. Ficou surpreendido da calma que reinava nesse lugar, e imediatamente começou gritar a plenos pulmões: 'O grande Pã morreu!' Apenas cessou de gritar, que todos ouviram de todos os lados queixas e gemidos, como os de muitas pessoas surpresas e aflitas por essa notícia.

Os que estavam no navio foram testemunhas dessa estranha aventura; e o ruído em pouco tempo se espalhou em Roma. O imperador Tibério quis ver a Tamo; viu-o, interrogou, reuniu os sábios para deles saber quem era esse grande Pã, e se chegou à conclusão de que era filho de Mercúrio e de Penélope."

Outros mitólogos, interpretando este fato, preferiram ver nele o fim do antigo mundo romano e o advento de uma sociedade nova.







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